Páginas

segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Igrejas trocam sinos de bronze por sistemas eletrônicos

Sino eletrônico da igreja do Caxingui fica numa sala reservada já que é programado e não precisa ser acionado diariamente

Ouvir as badaladas dos sinos do Vaticano ou do Mosteiro de São Bento de São Paulo na igreja católica do bairro está se tornando cada vez mais comum. A mágica é possível graças a um sistema de sinos eletrônicos que reproduz, por meio de alto-falantes, os sons das badaladas originais.

Muitas igrejas no país têm aderido aos sinos eletrônicos pelo alto preço dos convencionais e por outros inconvenientes desses elementos como o fato de exigirem a construção de uma torre e possuírem uma manutenção cara. Há ainda igrejas que mesmo tendo os sinos de bronze usam os eletrônicos por serem mais práticos, como é o caso da Paróquia São Cristóvão, no município de Cabo Frio, litoral do Rio de Janeiro.

De acordo com as principais empresas que comercializam esses sistemas no país, a demanda aumentou no último ano. A Orion Brasil, sediada no Rio de Janeiro, diz que a procura cresceu 20% este ano em relação ao ano passado. A Dynavox, do Espírito Santo, que revende os sinos eletrônicos da Belltron, uma empresa italiana, diz que também registrou crescimento nas vendas, mas não revela os números.

O mecanismo eletrônico permite que os padres programem que tipo de badalada deve ser tocada e em qual intervalo de hora. “O automático é mais barato, mais moderno e mais prático que o convencional”, atesta o padre Javier Mateo, 68, pároco da igreja Nossa Senhora do Carmo, em Santos, litoral norte de São Paulo.

Padre Alfredo conta que o sistema eletrônico foi uma forma para sua comunidade ouvir badaladas de sino.

Nascido e criado na Espanha, onde escutou muito o som de sinos tradicionais, padre Javier diz que gosta dos “artificiais” também. “A imitação é muito boa, as pessoas nem desconfiam”, conta. O prédio da igreja Nossa Senhora do Carmo é de 1966 e não possui torre, o que dificulta a colocação de sinos de bronze.

Esse também é o problema da paróquia de Santo Antônio do Caxingui, na Zona Oeste da capital paulista. A igreja não tem torre, nem nunca teve um sino. Para fazer com que a comunidade tivesse a experiência de ouvir sons de sino, o pároco Alfredo Veiga, 44, comprou, há dois anos, um sino eletrônico.

“É um sistema computadorizado, bem mais simples que o tradicional”, avalia. “A função do sino é mostrar a presença da igreja no meio da cidade e serviu para isso. As pessoas adoraram e tem gente que pára para rezar quando ouve a Ave Maria”, conta o padre. No Caxingui, as badaladas eletrônicas soam na melodia da Ave Maria ao meio-dia e às 18h. Já aos domingos, os sinos tocam badaladas diferentes antes da missa e na hora da celebração.

Moderno x tradicional
Para uma das freqüentadoras da igreja do Caxingui, a dona-de-casa, Glória Maria de Paula Souza, 66, o som do sino natural é mais bonito, mas a tendência da sociedade é adotar elementos mais modernos. “Dá para perceber algo mais eletrônico [no som], mas acho que ele representa o perfil do mundo moderno. Além do que o som chega muito mais longe”, afirma.

O funcionário de um estacionamento ao lado da igreja, Gil Rios Carneiro, 33 anos, concorda com Glória. “Acho que o antigo é mais tradicional, mas as coisas vão se modernizando e esse tem um som mais certinho”, opinou.

Sergio Pontiggia, um dos sócios da Dynavox, diz que graças à tecnologia o som do sistema tem uma qualidade muito próxima das badaladas verdadeiras. “Só um ouvido muito bem treinado reconhece [que não se trata do aparato de bronze]”.

Já para o relojoeiro Fábio Fonseca, que faz manutenção em sistemas de sino de bronze, o som do eletrônico é muito diferente. “Acho esquisito. As cornetas [usadas para propagar o som] não reproduzem o som grave das badaladas, só dá para ouvir o agudo e fica uma coisa irritante”, comenta.

Segundo Fonseca, a maior parte das igrejas construídas a partir da década de 60 não possuem torres, o que dificulta a colocação de sinos. Ele reconhece que o toque eletrônico sai bem mais em conta do que o convencional. De acordo com o relojoeiro, um quilo de bronze custa cerca de R$ 50, o que torna caro um sino de 300 quilos, adequado para uma igreja mediana. “É mais caro comprar os [convencionais], mas fazer o restauro não sai tão custoso”, diz ele, no caso dos templos que já possuem os exemplares de bronze. De acordo com Fonseca, a crise dos sinos fez com que as fundições desses aparelhos quase desaparecessem do país e hoje restam poucas.

Ouvido a quatro quilômetros
Para poder fazer ecoar o som do sino a quilômetros de distância, o equipamento conta com cornetas que são colocadas no teto da igreja. Em geral são usadas quatro, cada uma voltada para um ponto cardeal: norte, sul, leste e oeste. A capacidade de alcance varia de um quilômetro e meio a quatro quilômetros, se não houver obstáculos que impeçam a propagação do som, garantem os fabricantes.

O sistema pode conter as músicas já na memória ou ter as tocadas armazenadas em um CD. O preço vai de R$ 3,6 mil a R$ 15 mil. Há uma diversidade grande de tipos de badaladas e melodias como cantos natalinos, de adoração, marcha fúnebre, canções religiosas em geral, além dos sons de sinos famosos como os do Vaticano e do Mosteiro de São Bento. Mas há também os padres que não podem investir na aquisição e simplesmente compram um aparelho de som e um CD com a reprodução das badaladas.

A programação de como o sistema deve funcionar é feita por cada igreja e, segundo as empresas, se mantém sem alteração durante pelo menos dez anos. Caso o padre queira mudar algum dia, é só reprogramar o equipamento.

De acordo com Pontiggia, as igrejas que ficam nas cidades menores compram mais o sistema que as paróquias dos grandes centros, porque a população está mais acostumada a ouvir sinos. “Nas grandes cidades, as pessoas costumam dormir até tarde e reclamam do barulho do sino”, comenta.

Nenhum comentário:

Postar um comentário